20 de julho de 2017

Formatura da III Turma do Curso de Introdução à Cultura e Mitologia Yorubá


 

Ocorreu nessa Sexta-feira, 19 de julho, a festa de formatura organizada pelos alunos dos turnos da tarde e da noite. O Salão Nobre recebeu alunos, convidados e a mesa de abertura, composta pelo magnífico senhor Reitor Oscar Halack; a Pró-reitora de Pós-Graduação, Pesquisa, Extensão e Cultura, Márcia de Oliveira; a Diretora de Extensão, Marta Yvonne; o coordenador do Núcleo de Estudos Afro-Brasileiros, Osmar Soares; e o professor idealizador do curso, Arthur Baptista.

Discurso de Abertura

O coordenador do NEAB proferiu um discurso saudando à ancestralidade, contemplada pela ementa que se ocupa da cosmovisão yorubá para mostrar como o currículo eurocentrado ignora e desvaloriza a maneira que nossos ancestrais tratavam a verdade, a vida, a religiosidade. O discurso segue abaixo:


Boa noite a todos e todas,
Em primeiro lugar, gostaria de cumprimentar os meus ancestrais divinizados como manda a tradição africana, assim como esta manda cumprimentar os mais velhos e pedir licença aos mais novos que aqui estão.
Cumprimento o Magnífico Reitor Professor Oscar Hallac, a Digníssima Pró-reitora de Pós-graduação, Pesquisa, Extensão e Cultura Professora Márcia Martins, a Digníssima Diretora de Extensão Professora Martha Yvonne de Almeida, a Digníssima Diretora Andreia Bandeira Ribeiro, o meu irmão Professor Arthur Baptista e a Professora Alessandra Pio Silva, os formandos e as formandas da III Turma do Curso de Mitologia e Cultura Yorubá.
Hoje é um dia especial. Nesta quarta feira chuvosa e fria, vocês recebem o que pode parecer uma singela certificação dos estudos em cultura africana, estudos de uma cultura consubstanciada nas tradições milenares dos povos que integram a complexa rede de culturas da Yorubalande e seus reflexos na diáspora africano-brasileira e africano-caribenha bem como em outras partes do mundo; mas mais do que apenas uma certificação, o que ocorre aqui hoje é a a materialização da contínua realização do sonho de Olodumare para com os humanos: que eles, os humanos, formados da lama de Nanã e do sopro de Oxalá, tenham cabeça, o ori formado de um ipori, plancenta advinda das águas profundas das grandes mães ancestrais, que designam ao ser humano o destino e a propiciação da descendência nas penas e escamas do procriado. Hoje vocês se certificam que o ser humano é peixe da barriga de Iemanjá, âncora e barco livre nos pensamentos da grande mãe marítima, que engloba em seu seio direito a intelectualidade e a inteligência estratégica, em seu seio esquerdo a ancestralidade que guia os pés pelo caminho dos sentimentos e das emoções, podendo ver assim que o ser humano originado na África é um ser inteiro, projetado para a inteireza, formulado nos movimentos contínuos e apaixonado das águas salgadas em sexual e profunda entrega à luz solar espasmódica que engendrou na sopa entre marés dos peixes aos répteis, dos anfíbios aos mamíferos, dos deuses maiores da Natureza orixás aos deuses um pouco menores da natureza humanos, animais, plantas, água, fogo, terra e ar.
E hoje vocês saem daqui preparados para entender que isso tudo há muito já deveria estar no cerne, no coração de nosso sistema educacional. Nós que somos mestres e doutores em sobrevivência, nós os africanos do continente e da diáspora, que que temos povoado e desenvolvido culturas em todo o planeta há pelo menos 200 mil anos, quando a primeira mulher surgiu ao sul da Etiópia, e do seu útero formou todos os seres humanos de todos os tipos, nós que somos seres de carbono e energia em interação, que carregamos o pigmento que protege o núcleo das células das agressões de qualquer intensa radiação, que trazemos na memória genética a saga de rainhas e reis, contadores de histórias e inventores, primeiros médicos da humanidade através das folhas e da meditação, e guerreiros caçadores, príncipes e legisladores, filhos de rainhas conselheiras anciãs e curandeiras sacerdotisas, nós que estamos há mais de 500 anos denominados sob a pecha de escravizados e sequestrados, aqui, na formatura deste curso, resistimos.
Resistimos não apenas ao desalento assassínio do racismo, mas a toda a máquina de desumanização e devastação da natureza montada pelos conflitos territoriais que deram ao homem europeu o sobrenome de Colonizador. Resistimos com a força de nossos ancestrais e protetores à educação eurocentrada que mata por apagamento e silenciamento as verdades históricas e profundas que trazem cada rosto e cada cabeça formulada por Ajalá um dia no Orum.
E nós, como educadores, negros e não negros, temos o privilégio, aqui neste importante espaço para a história da Educação no Brasil, Colégio Pedro II, e a honra de perpetuar o que esses mais velhos disseram em resistência fundante de toda uma civilização africano-brasileira. Nosso não é só o privilégio, mas a responsabilidade de desenvolver nos nossos estudantes o respeito ao elemento africano da humanidade, o primeiro e ancestral de todos os seres humanos. Sejamos nós africanos na diáspora e no continente, brancos e não brancos, indígenas e não indígenas, nos reportaremos sempre à África e aos seus deuses Equilíbrio, Medicina, Sabedoria, Amor, Verdade, Ancestralidade, Riqueza, Perfeição, Liberdade, Inteligência, Coletividade, Realeza, Axé, para nos tornarmos seres humanos melhores. Pois que é olhando para trás que se pode preparar o futuro da humanidade, hoje, claramente posto como um trem lotado de pobres rumo ao abismo. Construamos a ponte com o futuro, eduquemos para a liberdade e para a coletividade, para o espírito e para a ancestralidade. Tenhamos responsabilidade com o que chamamos de natureza e humanidade. Recriemos no Aye o Orum que queremos.
Esse é o nosso compromisso e a nossa direção.

Parabéns a todos e todas!

É o desejo do Núcleo de Estudos Afrobrasileiros.

Prof. Osmar Soares da Silva FIlho